Há
seis anos eu criei esse blog como uma proposta dentro de uma atividade da turma
regular de Vedanta. A ideia era fazermos um exercício de contar fatos marcantes
da nossa história sem condenações nem julgamentos.
Um
exercício que quando começamos a fazer nos damos conta da imensa dificuldade
que é repassar nossa história com a capacidade de enxergar os fatos sem toda a
carga emocional que normalmente temos em relação a nossa vida.
Ao
tentar fazer esse exercício eu tive que escrever sobre situações que vivi, e o
mais desafiador, reescrever essa história, não do ponto de vista da pessoa
machucada e sofrida, mas de alguém capaz de olhar para vida e as relações de
uma forma mais objetiva, sem culpar nem absolver ninguém. Estar aberto para
perceber o que surgiria a partir desse novo olhar. E foi surpreendente. Um
exercicio que eu recomendo a todos. E que faço até hoje.
Na
época eu me enxergava como uma pessoa muito frágil e dependente. Estava presa a
vários conceitos que foram passados direta ou indiretamente para mim,
principalmente no que dizia respeito ao que se espera de uma menina ou uma
mulher dentro da sociedade. E relembrando agora os meus conflitos reconheço
que, em especial nós mulheres convivemos historicamente com muitas situações de
desvalorização, opressão, inferiorização e abusos. Abusos esses que nem sempre
se referem ao abuso sexual, mas que no dia-dia anulam a nossa força, nossa
capacidade, nossa natureza, e assim, acabam por calar e oprimir nossa melhor
expressão nesse mundo. Infelizmente foi a forma que a maioria de nós aprendeu a
se ver e a ser vista. Foi a visão que construíram e que construímos sobre nós
mesmas e sobre nosso papel social.
O estudo de vedanta e tantas atividades e reflexões propostas pelo
professor Jonas Masetti ao longo desses anos foram abrindo a minha percepção, e
de muitas outras colegas, sobre essas situações de abusos e o resgate da força e sensibilidade como mulher, e como
eu podia reconstruir isso na minha vida e nas minhas relações.
Uma
vez conversando com o professor Jonas falei que achava que desconhecia o que
era um verdadeiro amor, aquele que não é romântico, que não está ligado a
nenhuma troca ou acalento para o ego. Aquele amor que se fala tanto na
espiritualidade.
Eu
buscava nas minhas relações fugir da sensibilidade e vulnerabilidade, pois
achava que só assim eu poderia ser respeitada como mulher. Mesmo que no final acabasse caindo sempre nos meus velhos padrões de fragilidade e
dependência.
Um dia eu estava cuidando da
minha vó que está muito velhinha e em um desses momentos com ela eu relembrei a
conversa que tive com o professor onde ele me dizia que eu já conhecia esse
amor e que ele já estava comigo.
Enquanto ajudava ela a caminhar,
a se vestir, a deitar na cama, a dar banho, foi como se o tempo fosse parando
por alguns instantes, aquele momento que antecede algo muito importante e que
parece que a vida toda passa na nossa frente. Olhando aquele corpo tão
velhinho, daquela mulher que me cuidou tantas vezes, que tanto fez por mim,
agora ali, dependendo totalmente dos meus cuidados. Vi nós duas, em silêncio, entregues,
cada uma no seu ritual de gratidão, sensíveis e vulneráveis, mas fortes nas
nossas histórias que nos levaram até aquele momento. E ela mais uma vez fazendo
por mim. Dando-me a oportunidade de
finalmente perceber que esse amor que eu me achava incapaz de sentir sempre
esteve ali dentro de mim. E uma vida inteira fez sentido naquele simples
momento.
Eu não teria conseguido me
entregar a esse momento se eu já não tivesse descoberto que minha sensibilidade
e vulnerabilidade também são minha força.
Com a
ajuda do olhar do professor pude enxergar que para que eu encontrasse um certo
silêncio e paz, e pudesse me tornar uma pessoa inteira era preciso fazer as
pazes com meu passado, ou a resolução, mesmo que apenas interna, com a minha
história, com relacionamentos, com a pessoa que eu fui, e a que eu sou hoje.
Quando
a gente faz a trégua com nossa história, não é apenas uma maturidade emocional
que ganhamos. A nossa relação com o mundo e com as outras pessoas se
transforma. Nada mais está contra mim. Eu é que estou a meu favor e posso
contribuir com o mundo com essa energia.
Depois
de anos de estudo percebo cada vez mais forte a importância do papel do professor
nesse preparo da mente que me permitiu trilhar esse caminho de conhecimento.
Agradeço ao professor Jonas Masetti que com toda sinceridade, sensibilidade e
paciência mostrou-me que existia um caminho que devia ser trilhado por mim para
eu encontrar meu papel nesse mundo. E que justamente esse caminho ia me
aproximar daquilo que eu buscava. Uma leveza na vida, na minha história, e uma satisfação em poder contribuir na minha melhor expressão nesse mundo.
Om Sri Gurubhyo Namah